Turista exige – Peregrino agradece

Artigo de Inês Santos e Gonçalo Oliveira

No início do mês passado, arrancou uma peregrinação com os jovens de Santo António dos Olivais e de Viseu até Santiago de Compostela. O caminho que fizeram foi o “Caminho Inglês”, pelo norte de Espanha, partindo de Ferrol (a cerca de 120 km da meta).

Esta peregrinação é já a 3ª edição de um encontro franciscano entre as comunidades portuguesa, espanhola e italiana. Teve a 1ª edição, em 2014, pelo mesmo caminho, e uma 2ª edição, em 2019, pelo “Caminho Português”, partindo de Tui. Este ano houve mais de cem participantes, incluindo os freis, e foi uma peregrinação verdadeiramente desafiante e cheia de emoção.

No primeiro dia, antes de iniciar a caminhada, todos partilharam quais eram as suas expectativas para o caminho. Enquanto uns tinham a tela totalmente em branco e queriam deixar-se surpreender com a experiência, outros tinham ideias mais definidas.

A Clara, que participava pela primeira vez, disse-nos que, com este caminho, queria manter os olhos abertos a tudo e a todos, de forma a poder superar medos e sair com o coração cheio de fé, alegria, amor, novas amizades e uma nova família.

Já o Jorge André “Droó”, um dos animadores que participou nas duas edições anteriores, afirmou que queria ser um porto de abrigo, estar disponível para os outros e possibilitar a todos a mesma experiência que tivera, em 2014.

A rotina vivida nos dias da caminhada começava bem cedo, com a hora de acordar às 6.30h da manhã. Dormia-se no chão em cima de um carrimate, ao lado dos companheiros de viagem. Em pouco tempo tínhamos que fazer a mochila, vestir e apanhar o pequeno-almoço para começar logo a andar. Houve até dias em que se lavaram os dentes já a caminhar!

Durante o caminho cada um ia interagindo com quem caminhava ao seu lado, independentemente da nacionalidade.
Por vezes formavam-se pequenos grupos que se iam motivando com jogos, adivinhas ou longas conversas para se conhecerem.

Por dia, fazia-se uma média de 20 km que terminavam no próximo local de descanso. A chegada era quase sempre pela hora de almoço e éramos recebidos com um grande sorriso pela empresa de catering, que sempre nos acompanhou e alimentou até Santiago.
À tarde era tempo de descanso, catequeses com temas ligados ao caminho (sonhos, experiências, fraternidade, santidade, amizade e compromisso) e celebração da Missa, sempre que possível com as comunidades locais.
À noite, havia oportunidade para algum convívio e para tratar das bolhas dos pés e das feridas. Antes de deitar havia uma pequena oração para agradecer pelo dia vivido e ganhar forças para a etapa seguinte.

A chegada a Santiago foi um verdadeiro pináculo de emoção e alegria

Chegada a Santiago de Compostela

A entrada nas ruas até à catedral foi feita em grande grupo, com todos a cantar e a tocar.
Ao chegar à praça, muitas foram as lágrimas e os abraços de alegria que este grupo fraterno partilhou.
O entusiasmo e a realização de que um longo percurso cheio de dificuldades foi algo que verdadeiramente encheu o coração de todos e fez esquecer todas as dores.

Ao final da tarde tivemos Missa na Igreja de São Francisco, que fica a alguns metros da praça do Obradoiro, e que, não só seria o último marco antes do verdadeiro terminar desta peregrinação, como seria, também, o nosso agradecimento a São Francisco pela inspiração que a sua vida nos dá em seguir uma vida de simplicidade e fraternidade no caminho com Deus.

O dia seguinte, já com mais calma e repouso em camas, levou-nos de manhã até à entrada da Porta Santa ou Porta do Perdão. Aqui nos preparámos para encontrar o túmulo do apóstolo Santiago e para receber a Indulgência Plenária. A peregrinação terminou com a Missa do peregrino, presidida pelo bispo, na catedral de Santiago, onde foi possível ver em ação o majestoso “Botafumeiro”.

Muitas foram as lições que pudemos aprender

Eis o resumo feito pelo frei Juan dos cinco sentidos do caminho:

  1. Sem meta não há caminho – É a meta que dá significado ao caminho. Onde pretendemos chegar com a nossa vida? É saber que outros também atingiram uma determinada meta que nos dá ânimo e força para começar. Veja-se os caminhos para a Santidade.
  2. Perceber qual é o caminho que Deus quer para mim – Há muitos caminhos para uma mesma meta. Não só é preciso perceber se o caminho que estamos a seguir é o correto, como não nos podemos deixar perder e ficar sem rumo.
  3. Saber se o peso que levamos connosco é essencial – Na peregrinação tudo o que precisamos temos que transportar. Para que o peso não nos afunde no caminho, é preciso conhecer que bagagem na nossa vida é secundária, da qual nos podemos libertar.
  4. Encher os espaços vazios com oração e espiritualidade – A oração permite libertar-nos de muitos pesos sem nos deixar vazios. A oração leva-nos mais longe no nosso caminho e mais cheios do que quando partimos. A oração ajuda a encher o vazio no nosso coração com o amor de Deus.
  5. Não se pode caminhar sozinho – A vida que Jesus nos ensinou é uma vida de amor e fraternidade. O caminho ganha outra beleza quando pode ser partilhado.

O que é ser peregrino?

O que é ser peregrino? Encontro com o Sr. Manuel.
O que é ser peregrino? Encontro com o Sr. Manuel.

Esta provocação foi feita pelo Sr. Manuel, que abordou um pequeno grupo de peregrinos e os tratou com verdadeira alegria e emoção. Fez lembrar a descrição do encontro de Jesus com os discípulos de Emaús. Antes de partirem ele abraçou cada um com um aperto verdadeiro e deixou a resposta à pergunta “Ser peregrino é dar uma oportunidade a Deus para mudar a tua vida”.

Um casal de namorados

O Adrián e a Mariana são um casal de namorados que se conheceu nos caminhos, em 2019. Partilharam connosco o significado de voltarem a reencontrar-se no mesmo sítio passados três anos:

O caminho para nós significa união. Uma forma de unir não só as pessoas entre elas, mas também com Deus. É uma experiência que mudou a nossa vida, pois realmente vimos os desafios e as nossas diferenças como uma maneira de crescermos na fé e no amor.
A ideia de fraternidade que temos bem presente nos caminhos, significa que, se é verdadeiramente um caminho de felicidade, e, assim sendo, um caminho de santidade, significa que Deus não quer que caminhemos sozinhos. Efetivamente, o caminho nunca acaba, porque quem o realiza a partir do coração, experimenta uma evolução interior que o muda para sempre.

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