Frei Jorge Marques
O Santuário de Santo António, em Lisboa, tem uma mensagem clara que quer transmitir a quem o visita: Aqui nasceu Santo António!
Segundo a tradição, este é o local onde nasceu Fernando de Bulhões. Tratando-se de uma família cristã, decidem batizar o pequeno Fernando na Sé Catedral. Aí, Fernando começa a sua vida cristã e descobre a sua fé: este é um testemunho importante sobretudo para os jovens, que valorizam não só as suas raízes humanas, mas também cristãs e culturais.
Mais tarde, Fernando de Bulhões ingressa nos Cónegos Regrantes de Santo Agostinho, no Mosteiro de São Vicente de Fora, pedindo depois transferência para Coimbra, onde continua os seus estudos por mais dez anos no Mosteiro de Santa Cruz.
Este percurso pode demonstrar alguma inquietação de Fernando. Pode ter-se sentido de alguma forma confinado pois, se por um lado tinha o coração cheio da palavra de Deus resultado dos seus estudos, por outro sentia o desejo de partilhar esse conhecimento, difundir o conhecimento que considerava estar fechado nas abadias e mosteiros, longe do povo.
Por isso, depois de conhecer os cinco frades que passaram por Coimbra, surge o desejo de os imitar e levar a Palavra ao coração de mais gente, principalmente daqueles a quem chamavam infiéis. Trata-se do princípio de uma globalização da idade média, realizada pelos frades enviados por São Francisco um pouco por toda a Europa e mesmo até outros locais. No seguimento disto, Santo António ter-se-á sentido interpelado a participar numa nova aventura, nestes novos tempos de levar o Evangelho de Cristo ao coração de toda a gente, mesmo com o risco de dar a vida por Ele.
Na verdade, esta foi uma condição que colocou quando decidiu tornar-se franciscano: partir para Marrocos e seguir o caminho e atitude dos primeiros cinco frades mártires que conhecera em Coimbra e que o marcaram profundamente.
É esta necessidade de partilhar o seu profundo conhecimento dos evangelhos que é reconhecido por São Francisco de Assis, anos mais tarde, quando Santo António, já em Itália, revela toda a sua erudição em Forlì.
Este reconhecimento é um acontecimento decisivo e mesmo revolucionário para a ordem franciscana: se no início São Francisco ficou encantado pela descoberta da frescura e simplicidade do evangelho de Cristo, opondo-se ao ensino, com Santo António vai alterar a sua posição e permitir, pela primeira vez, o ensino dos frades.
Desta forma, Santo António sem abdicar de toda a sua cultura e sabedoria, não se impondo, leva São Francisco a aceitá-la, através de uma pequena, mas preciosíssima carta, autorizando Santo António a ensinar as Sagradas Escrituras aos irmãos, desde que não perdessem a sua devoção original. Este facto dará abertura para que muito teólogos franciscanos pudessem segui-lo, sendo efetivamente um marco na história e no pensamento teológico-filosófico da igreja.

Frei Jorge Marques
Definidor Provincial da Ordem dos Frades Menores em Portugal.
Guardião da Fraternidade de Santo António, na Casa Igreja de Santo António, em Lisboa.
Foto da capa: Lisboa – Igreja de Santo António, que se ergue no local onde, segundo a tradição, nasceu Santo António. Foto MSA 2015.
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