Obra: Ressurreição, manual de instruções
Autor: Fabrice Hadjadj
Edição: Editorial AO
Páginas: 200
Se a Ressurreição de Jesus constitui o acontecimento central para a fé cristã – a ponto de a ela se deverem referir todas as suas práticas, éticas e litúrgicas, pastorais e teológicas –, falar deste acontecimento constitui, para cada geração de crentes, um desafio difícil.
O livro do filósofo francês Fabrice Hadjadj integra-se neste desafio, tão exigente como necessário. Partindo dos textos neotestamentários, com a sua linguagem plural, Hadjadj traça um percurso muito pessoal do modo como contempla a Ressurreição de Jesus, sempre em diálogo com a fé da Igreja e com as coordenadas do quotidiano.
“As aparições do Ressuscitado têm um caráter eminentemente prático. Não são fantasmagorias para fugir ao hic e especular sobre lugares distantes; reconduzem-nos ao amor ao próximo, ensinam-nos a ver as coisas do alto, quer dizer, não coisas diferentes das que vê o comum dos mortais, mas as mesmas coisas a partir do Espírito”.
Ao longo de 12 breves capítulos redigidos numa linguagem clara e direta, este Manual de Instruções não contém listas de mandamentos ou condutas éticas que, por vezes, erradamente se apresentam como modos de aplicar a fé pascal. Uma vida de fé constitui sempre um conjunto de práticas, não necessariamente derivadas de uma compreensão teórica ou catequética.
Por isso este livro é prático na medida em que são as práticas que estão no centro e na origem de uma pergunta fundamental: quem é o Ressuscitado? Por outras palavras: como se escrevem as coordenadas do teu existir pascal?
O que está em causa é a progressiva dinâmica do Ressuscitado na vida quotidiana dos crentes, a começar pela vida daquele que assume o risco da fala e da escrita.
Sem cair em lugares-comuns da linguagem nem repetições dos catecismos, Hadjadj evita também as difíceis linguagens teológicas ou conceptuais com que o Mistério Pascal é por vezes apresentado.
“A última lição do Verbo encarnado consistiu em retomar gestos simples, ensinando desse modo aos discípulos a não o continuarem a ver a Ele, mas a ver todas as coisas n’Ele, e a reconhecer a sua glória através de tudo o que vai aflorando em cada dia”.
Cada passagem dos Evangelhos ou dos Atos dos Apóstolos relativa aos encontros com o Ressuscitado é lida de modo atento, procurando, não uma análise técnica do texto, mas o modo como os caminhos pelos quais os discípulos têm de percorrer – espirituais, psicológicos, pessoais e comunitários –, continuam a ser bem próximos dos caminhos que nós, os discípulos de hoje, encontramos à nossa frente, nas oportunidades, desafios e estruturas, humanizantes e desumanizantes, da sociedade de hoje.
“É possível admirar a vitória do Ressuscitado, mas essa ascensão seria a maior queda se o crente só se desfizesse do seu medo de morte para se tornar um monstro de orgulho, desprezar as obras do Criador e ignorar a humildade do Messias. A glorificação de Jesus deve desembocar no desaparecimento do Ressuscitado e no envio do seu Espírito, que faz viver o quotidiano a partir do seu derramamento, a partir do Inefável e rumo a ele”.
You must log in to post a comment.