Não, não é engano. Sei bem que o tema deste Tempo da Criação, que estamos a celebrar, se formula com outro verbo. Trata-se do verbo escutar, e o convite que nos é dirigido é que escutemos a criação. Sei também como é importante, mesmo indispensável, que o façamos. A nossa incapacidade para escutar essa voz conduziu-nos à situação em que nos encontramos. E os sinais de alerta estavam aí. Primeiro pouco numerosos, pouco impactantes, deixando ainda lugar para duvidas. Por isso a imensa maioria de nós os ignorou. Aqueles que nos chamavam a atenção para o que se estava a preparar, eram apelidados de alarmistas e de falsos profetas.
Pouco a pouco, e de uma maneira cada vez mais acelerada, os sinais foram-se tornando mais evidentes, deixando menos espaço para dúvidas. Aumentou o número daqueles que começaram a falar da necessidade de estarmos mais atentos e, mesmo, da necessidade de mudarmos de estilos de vida. O que estava já a acontecer foi-se tornando mais claro e começou a ser mais fácil colocar a questão ecológica no centro das atenções e das preocupações.
Hoje vivemos, a este nível, uma situação bem distinta. Diminui o número de aqueles que não querem reconhecer a evidência das alterações climáticas e os enormes desafios que enfrentamos ao nível ambiental. Já é fácil perceber que a situação que enfrentamos vai exigir a mudança dos nossos estilos de vida e que gestos ‘pequenos’ (bem grandes), como fechar a água enquanto nos ensaboamos ou lavamos os dentes, podem fazer uma enorme diferença.
Nesta mudança de atitude, que precisa ainda de ser mais enérgica, desempenharam um papel fundamental as constantes interpelações do Papa Francisco. Bem cedo no seu pontificado começou a chamar a atenção para o enorme desafio que enfrentamos como humanidade. A encíclica Laudato si’, marcou, neste âmbito, uma mudança de tal maneira significativa que podemos falar num antes e num depois. Agora o cuidado da casa comum, metáfora, que se tornou de uso corrente, é também um tema central na reflexão e ação das comunidades cristãs. Cuidar desta casa torna-se também critério para aferir a fidelidade da fé cristã.
A categoria ecologia integral, proposta neste texto, alarga ainda mais o horizonte, de tal modo que a questão ecológica não pode mais ficar reduzida à sua dimensão climática. As dimensões sociais, económicas, culturais e da vida quotidiana são também destacadas. O bem-comum surge como critério maior para orientar a ação. A questão ecológica é agora mais facilmente entendida como uma questão humana. No fundo sempre o foi, mas demorámos muito tempo a percebê-lo. Escutar o grito da terra e o grito dos pobres é uma obrigação e exigência para aqueles que se dizem discípulos de Cristo.
De tal maneira a escuta deste(s) grito(s) se tornou evidente que ousamos mesmo dizer que nele(s) se escutam também as interpelações que Deus nos dirige. E na resposta a essas interpelações, encontraremos certamente os caminhos a que nos está a convocar
Por tudo isto é evidente que o tema escolhido para este Tempo da Criação é acertado. Mas se a escuta é necessária, e mesmo indispensável, ela não chega para lidarmos com os desafios que enfrentamos. Não podemos deixar de escutar, mas é urgente começar a responder. Por isso a proposta do título que encabeça estas linhas. O tempo que vivemos tem de ser já o tempo da resposta. Não basta perceber a necessidade da mudança. É urgente concretizá-la. Em certo sentido, a verdade da escuta pode ser aferida pela ousadia da resposta.

As chamadas de atenção e a presença da temática tanto nos discursos dos líderes políticos e religiosos, como no comum dos cidadãos, é um passo muito importante, mas será, sem dúvida, um passo curto se ficar só, ou essencialmente, a este nível. Nas repostas concretas que soubermos e quisermos dar ao grito da terra e ao grito dos pobres encontraremos, não tenho dúvidas acerca disso, o rumo que estamos a percorrer enquanto humanidade.
E essas respostas não são só competência dos líderes já referidos. Claro que eles têm um papel importantíssimo, mas não basta.
O lugar dos cidadãos, também daqueles que se dizem cristãos, é imprescindível. Cada um de nós é chamado a dar essa resposta. As mudanças de estilo de vida que são necessárias só serão possíveis se forem consolidadas com os passos do dia-a-dia. A mudança global, que se exige para o futuro, tem de começar hoje e tem de ser edificada sobre os gestos concretos de cada um.
O que está a acontecer ao nível da nossa casa comum pode parecer indicar que já é tarde e não vamos a tempo. Certamente teria sido melhor sermos mais rápidos, pois algumas das consequências da nossa lentidão já se fazem sentir e provocam dor, sobretudo, como sempre, entre os mais frágeis, mas ainda vamos a tempo:
O criador não nos abandona, nunca recua no seu projeto de amor, nem se arrepende de nos ter criado. A humanidade possui ainda a capacidade de colaborar na construção da nossa casa comum.
LS, 13
Este é o tempo de responder à voz da criação.
Foto da Capa: Reutilizar, Reduzir, Dançar, Reciclar, Repetir – Foto AS Photo Project – stock.adobe.com
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