ReANIMAR a economia

No dia 1 de maio de 2019, o Papa Francisco surpreende com uma carta dirigida a um público abrangente: um convite a jovens economistas, empresários e empresárias do mundo inteiro para um encontro sobre economia.

Na carta de apelo do Papa Francisco dirigida aos jovens empreendedores do mundo, o Papa pede aos jovens para “juntos se conhecerem” e, depois, “fazerem um ‘pacto’ para mudar a economia atual e dar uma alma à economia de amanhã”.

A Economia de Francisco é um compromisso desenhado pelos jovens para jovens

É um convite que lhe nasce do mais fundo das suas preocupações sobre o drama dos pobres  e excluídos: encontrar-se com os que “estão a formar-se e começam a estudar e a pôr em prática uma economia diferente, que faz viver e não mata, inclui e não exclui, humaniza e não desumaniza, cuida da criação e não a devasta”.

Continua a surpreender-nos a capacidade de iniciativa e a determinação deste papa que aceita o desafio de procurar uma intervenção nas causas e não se deixa enredar em lamentações e conselhos piedosos ao nível dos efeitos. 

A convocatória escolhe uma cidade “que desde há séculos é símbolo e mensagem de um humanismo de Fraternidade…” e tem consigo a memória de um momento único em que Francisco de Assis, na praça principal, resolve o conflito com o Pai despojando-se até à nudez e proclamando que a partir desse momento Deus será o seu Pai. O Papa juntamente com o atual bispo de Assis irão acolher agora um movimento imprevisível nas suas consequências. 

Em janeiro de 2020, as inscrições tinham ultrapassado as 2000 e um núcleo significativo de Prémios Nobel irão estar presentes e dar o seu contributo, entre eles Muhammad Yunus, economista bengalês e Prémio Nobel da Paz de 2006.

Nas “doze aldeias” como espaço de encontro e de debate perpassarão os desafios de novas hipóteses de configuração de uma economia que não mate. Trata-se de reanimar (dar  uma nova alma) a economia (curiosamente os brasileiros traduziram por realmar a economia). As hipóteses de uma economia de rosto humano, as soluções de decrescimento sustentável, as mudanças de paradigma irão certamente fazer parte da capacidade e da invenção de quem deseja um mundo mais humano e uma terra mais habitável.

A preparação para ente encontro está a passar por momentos de debate e de aprofundamento em cada um dos países participantes.  

O Papa Francisco convida os crentes a colocar a sua força em Cristo Ressuscitado:

Se ouvirdes o vosso coração, sentir-vos-eis portadores de uma cultura corajosa e não tereis medo de arriscar, nem de vos comprometer na construção de uma sociedade renovada.  O desafio para  um pacto comum, um processo de mudança global que veja em comunhão de intenções não apenas quantos têm o dom da fé, mas todos os homens de boa vontade, para além das diferenças de credo e de nacionalidade, unidos por um ideal de fraternidade atento, acima de tudo, aos pobres e excluídos.

Economia de comunhão, de crescimento sustentável, capacidade criativa para arquitetar os sonhos de uma nova etapa da Humanidade diante da urgência de mudança dos paradigmas económicos. 

O Papa Francisco tem essa capacidade de coerência lançando desafios improváveis.

Homens e mulheres de reconhecida competência na área económica marcaram já a sua presença no encontro. Uma presença significativa de jovens empresários e economistas vai dar força e novidade ao encontro. 

A importância do acontecimento vai provocando ondas de choque e os setores religiosos, sobretudo de cariz pentecostal, ligados à chamada “teologia da abundância”, bem como os setores de visões capitalistas e liberais não deixam de manifestar a sua inquietação, chamando a atenção para este questionar dos fundamentos da organização do bem-estar do mundo capitalista e do seu acumular de riqueza.


Que novo paradigma é este?

Ricardo Zózimo, in VER – Valores, Ética e Responsabilidade, Nov 7, 2019

Ricardo Zózimo, Diálogos com António 2020: A Economia de Francisco, Coimbra, 1  de março 2020, Foto MSA.
Ricardo Zózimo, Diálogos com António 2020: A Economia de Francisco, Coimbra, 1 de março 2020, Foto MSA.

Mas o mais especial e talvez até surpreendente desta proposta de Assis é mesmo a forma e, por ora, não o seu conteúdo. Ao mudar a forma, o Papa Francisco pede-nos para colocar os jovens no centro da mudança. E pede que esta nova economia seja revisitada a partir do pensamento dos jovens. Aqui, arrisco-me a dizer que o Papa Francisco se inspira na irreverência do sempre jovem S. Francisco de Assis, cujo nome tomou e que norteia este encontro. A história do jovem S. Francisco mostra-nos o que pode fazer a combinação de força interior, ingenuidade e sonho!

O Papa convoca os jovens para um encontro de compromisso. E aqui começam as diferenças de paradigma. A Economia de Francisco não é um think tank que emite opiniões e não é, seguramente, um novo modelo económico que vai ser apresentado. A Economia de Francisco é um compromisso desenhado pelos jovens para jovens. E claramente é no espaço e tempo de Assis que este compromisso vai ser desenhado, conversado e aceite pelos jovens. Mas num mundo que impõe tantas vezes aos jovens o que eles devem ser ou pensar, o Papa muda o paradigma ao colocar os jovens e o seu compromisso no centro do encontro de Assis.

E esta centralidade dos jovens atravessa toda a forma como o programa está desenhado. O Papa pediu ao Professor Luigino Bruni para organizar este encontro, motivando-o a que colocasse os jovens no centro. Bruni e a sua equipa assim o fizeram convocando 25 jovens do mundo inteiro para serem os principais organizadores do encontro. Mas eles não o fazem com as suas opiniões, pois o encontro está a ser desenhado com base na motivação expressa nas milhares de candidaturas já recebidas pela organização.

O que não é possível antecipar é a transformação que 50 jovens portugueses, em partilha com mais de 1500 jovens de todo o mundo, trarão para as suas empresas, organizações e vidas pessoais depois deste encontro com a Economia de Francisco(s). De uma coisa tenho a certeza. Este encontro vai transformar e esta transformação está em boas mãos!


Foto da capa: Crise da farinha no Paquistão. Sementes de trigo, num mercado de Peshavar, Paquistão, 21 de janeiro 2020. Foto: EPA / BILAWAL ARBAB.

1 comentário em “ReANIMAR a economia”

  1. O evento a Economia de Francisco foi adiado para 21 de novembro. Também os Diálogos com António foram adiados para novas datas a anunciar quando possível.

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