Dor. Tristeza. Impotência. Desilusão
No dia em que escrevo, são as lágrimas que caiem nesta folha branca a tirar cor ao dia: cinza no ar; cheiro a queimado; temperaturas sufocantes e as confirmações assustadoras.
Quando pensávamos que tínhamos atingido o máximo do drama em Pedrogão, tivemos de conter a respiração para poder ver o país a arder.
Os números das pessoas que perderam a vida são inimagináveis; as pessoas que perderam as suas casas com todos os seus bens vivem agora a dramaticidade de ‘ficar sem nada!’; os feridos lutam para sobreviver; o verde das florestas… desapareceu.
Foi o pior dia do ano: 523 incêndios num só dia. As imagens e as notícias falavam de vários incêndios fora de controle. As pessoas tentavam sobreviver. Os meios faltavam. O fogo sobrava.
Diante de tão grande desastre, ficamos anestesiados, quase sem reação, quase sem voz, quase sem sentido…
O que dizer? O que pensar? O que fazer?
Ficamos todos mais pobres, mais tristes, mais impotentes… Afinal, somos muito do que nos envolve, dos espaços que habitamos, das dores que enfrentamos… Afinal, somos o que perdemos, somos a frustração, somos as perdas.
Diante de tão grande drama, como lidar com as pessoas que provocaram os incêndios?, como lidar com a incompetência de muitos responsáveis no combate?, como lidar com políticos que pouco fazem no ordenamento do território e na implementação de medidas corajosas?…
Os incêndios decorrem de muitos fatores: mão criminosa, interesses especulativos, causas naturais, descuidos humanos, falta de ordenamento do território, condições climáticas excecionais, falta de meios de combate, desorganização nos comandos operacionais… protagonismos, inexperiência e amadorismo.
No final, fica um rasto de destruição. Um cenário de ‘terra queimada’, um cenário de guerra… um cenário de morte. O fogo destrói a vida. O fogo tira-nos as palavras.
Quando perdemos tanto, resta-nos a esperança
Quando perdemos tanto, resta-nos a esperança, resta-nos a possibilidade de unir as mãos, resta-nos o futuro.
O fogo queimou tudo… mas quem está vivo tem a responsabilidade de ajudar a ‘reconstruir’ a esperança do amanhã. Não há mais nada a que agarrar-se.
Diante de tão grande drama, restam-nos os pequenos gestos e os pequenos milagres: uma ajuda, uma presença, uma porta aberta, um silêncio, um abraço, uma palavra, uma oração.
Nas tragédias não há heróis
Nas tragédias não há heróis, mas há pessoas que dão o que têm, lutam com todas as suas forças, não abandonam ninguém, arriscam a vida… até a perder.
Rostos anónimos, pessoas desconhecidas… homens e mulheres que fazem a diferença.
Neste sentido, não podemos deixar de reconhecer o empenho dos bombeiros, o contributo de muitos civis, a generosidade de muitas pessoas e instituições, a oração de muitas comunidades…
Que paulatinamente a esperança possa ressurgir, que este ano o inverno seja o início da primavera, que a dor nos faça erguer mais humanos e solidários.
Que Deus recolha todas as nossas lágrimas e nos ajude a reescrever a esperança no livro da vida.
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