Quando dizes TODOS, são mesmo todos?

Um artigo de Inês Santos e Gonçalo Oliveira


Divorciados, homossexuais, transgéneros, apoiantes do aborto, da eutanásia, prostitutas e prostitutos, pessoas que se masturbam, violadores, adúlteros, vendedores e consumidores de droga, feministas, terroristas, ditadores, empresários e políticos avarentos, ladrões, ateus e os que estão em falta, que queira juntar.

Deixe adivinhar… Usaria, esta lista, para colocar, à porta das Igrejas, com o sinal “Proibido Entrar”?

Se o seu instinto foi esse, atenção! Está a ingressar por uma valente hipocrisia! Quem começa listas idênticas, rapidamente se inclui na matilha.

É fenomenal como o mundo se recheou de cristãos, encenando o papel de escribas e fariseus, de pedra na mão, prontos a julgar “a mulher adúltera”. Para quem se recorda, “o que for livre de culpa, que atire a primeira pedra” (Jo 8, 1-11)

Assim nos ensinou Jesus uma das lições mais importantes, que o Papa quis reforçar nas homilias da JMJ 2023. “Todos, todos, todos” são filhos de Deus e chamados à Igreja. Tão importante é este lema que o Papa o repetiu vinte e cinco vezes! Poderá ser mais óbvio? Leia com zelo este pequeno excerto:

Não tenhais medo, lançai as redes. Não vivais acusando «isto é pecado, isso aí não é pecado». Vinde todos… depois falamos. Mas, primeiro, sintam o convite de Jesus, depois virá o arrependimento e enfim a proximidade de Jesus. Por favor, não transformem a Igreja numa alfândega: aqui entram os justos, os que estão em ordem, os que estão bem casados… todos os outros lá fora. Não. A Igreja não é isto. Justos e pecadores, bons e maus, todos, todos, todos. Será depois o Senhor a ajudar-nos a resolver este assunto. Mas todos.

Papa Francisco

Esta é, também, a fé da Igreja, assente na esperança humana de reconhecer o amor de Deus. Jesus não veio ao mundo com uma lista de julgamentos, mas de ensinamentos. “Quem tem ouvidos para ouvir, ouça” (Mt.13,9). Que estamos à espera para ouvir? Para ouvir que Deus ama a todos de forma igual? Que somos todos irmãos? Que também nós devemos amar, ser humildes, fraternos, ter caridade? Porque continuamos surdos, cegos, mudos e paraplégicos ao que Jesus nos ensinou? Escondidos no canto mais escuro do mundo, como pequenas lagartixas, à espera de que ninguém nos incomode.

A juventude é de todos, a Igreja é de todos, Jesus é de todos, amar é dever de todos. Não sigamos falsos dogmas, mas sim a vida de Jesus. Sem imposições e restrições. Só a demonstração de algo incondicional, como o dar a vida pelo outro.

Da próxima vez, quando achar que alguém não pertence à Igreja ou não se deva sentar ao seu lado na missa, lembre-se de todas as vezes que pecou. Se não lhe ocorrer nada, peça imediatamente perdão e ajuda ao Pai, porque anda desatento e perdido na vida.

Quem acha que nunca pecou, nunca viveu. E olhe que a vida é dom de Deus! Talento a ser usado.

Sem penitência e arrependimento, não podemos viver em plenitude. Perdemos a empatia pelo próximo e, consequentemente, a capacidade para amar. Assim, afastamo-nos de Deus. O cristão julgador que afasta o outro acaba, também, por afastá-Lo.

Este é o caminho da Igreja: ir ao encontro de todos os que queremos que fiquem longe de nós. Quanto mais longe, maior a nossa caminhada e compromisso. Com um pouco de sorte e a graça de Deus, pode dar-se o caso de sermos avistados… e… quem sabe… virem, também, ao nosso encontro.

Foto da capa: “Uma vida sem crise é uma vida asséptica. Uma vida sem crise é como a água destilada, não sabe a nada. Não serve para nada, senão para guardar no armário à porta fechada. As crises têm que ser atravessadas, devemos aceitá-las. E raramente sozinhos”.
Papa Francisco aos jovens da Scholas Occurrentes(*), Cascais, 3 de agosto de 2023. Foto António Cotrim/LUSA/POOL.

(*) Scholas Occurentes – Movimento dos jovens pela educação que procura devolver-nos o significado do que fazemos através do desporto, da arte e da tecnologia. Estamos empenhados em criar um ambiente inclusivo e transformador, onde cada jovem possa desenvolver o seu potencial e contribuir positivamente para o mundo que o rodeia.

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