Não a um cristianismo de sobrevivência

Com a devida vénia, tomamos a liberdade de usufruir da décima meditação que Tolentino Mendonça dirigiu ao Papa e à Cúria Romana, reunidos em retiro espiritual.

O tema visava as Bem-aventuranças que, aplicadas à vida humana, representam uma força transformadora e fascinante. Daqui o apelo: “Não a um cristianismo de sobrevivência e a um catolicismo de manutenção!”. Um verdadeiro crente, uma comunidade que acredita, não pode viver para a manutenção:

precisa de uma alma jovem e enamorada, alimenta-se da alegria da procura e da descoberta, arrisca a hospitalidade da Palavra de Deus na vida concreta, começa pelo encontro com os irmãos, no hoje e no amanhã, vive no diálogo confiante e silencioso da oração.

Por isso, é urgente redescobrir “a bem-aventurança da sede”; na verdade, a coisa pior para um crente é “ficar saciado de Deus”. Pelo contrário, felizes os que têm fome e sede de Deus; pois a experiência da fé diz que

não se trata de resolver a sede, mas de ampliar o nosso desejo de Deus, de intensificar a nossa busca d’Ele.

As bem-aventuranças são o auto-retrato mais acertado e fascinante de Jesus, a chave da sua vida, a imagem que Ele incessantemente nos revela e grava nos nossos corações. Porém, este retrato deve servir-nos de modelo no processo de transformação do nosso próprio rosto, da nossa própria vida. Na medida em que sejamos o Seu retrato e a Sua memória, então O veremos tal como Ele é e saberemos manifestá-Lo aos outros.

Nos dias passados, assistimos a uma iniciativa significativa: a iluminação de alguns símbolos do martírio e do testemunho cristão, como o Coliseu de Roma, a catedral de Alepo, na Síria, a Igreja de S. Paulo, em Mosul, no Iraque, e, em Portugal, a imagem do Cristo Redentor em Almada. Uma iniciativa que pretendeu apresentar ao mundo a beleza da Fé cristã, que encontra no testemunho das bem-aventuranças a força para perdoar e amar, o único critério para reunir os homens na unidade e no respeito das diferenças.

Apraz-nos recordar o testemunho de Rebecca, uma jovem nigeriana cristã que foi raptada e escravizada durante dois anos pelo movimento Boko Haram. Ela viu o seu filho de um ano ser afogado, por recusar repudiar a sua fé. Maltratada e violentada, ficou grávida e escolheu acolher o bebé. Perdoou a quem tanto mal lhe fez: “Se Jesus perdoou a quem o matou, quem sou eu para não fazer o mesmo?”. E, às raparigas do seu país, perseguidas e raptadas, aconselha: “Rezai todos os dias, nunca deixeis de rezar, e, como aconteceu comigo, sereis livres”.

Ser cristãos é acreditar em Alguém que nos ama e que nos faz amar como Ele nos amou.

1 comentário em “Não a um cristianismo de sobrevivência”

  1. excepção feita e aceite quando “a sobrevivência” for assegurada pela fé e iluminada pela luz da vida, tal como se encontram as ruínas do Coliseu

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