A Palavra de Deus
Então Pedro aproximou-se de Jesus para lhe perguntar:
“Senhor, quando o meu irmão cometer faltas contra mim, quantas vezes devo perdoar-lhe? Até sete vezes?”
Jesus respondeu-lhe: “Não te digo até sete vezes, mas até setenta e sete vezes. Assim, o reino dos Céus é comparável a um rei que quis resolver as suas contas com os servidores. Começava, quando lhe trouxeram alguém
que lhe devia dez mil talentos. Como este homem não tinha com que lhe pagar, o chefe mandou que o vendessem com a mulher, os filhos e todos os seus bens, como reembolso da sua dívida. Então, caindo a seus pés, o servidor, prosternado, dizia:
“Tem paciência comigo, e pagar-te-ei tudo”.
Tomado pela compaixão, o chefe deste servidor deixou-o partir e perdoou-lhe a dívida…
Mateus 18 , 21-27
A palavra de Santo António
O que acontece no Reino dos Céus lembra um rei que quis resolver as suas contas com os servidores.
Este rei, Jesus Cristo, foi rei na sua Paixão, recebeu a coroa de espinhos, o manto escarlate do sangue e o cetro de vime. O rei Jesus Cristo paga as suas contas quando, neste mundo, julga os méritos de cada um, antes de os julgar severamente no mundo que há de vir…
O servidor lançou-se a seus pés e suplicava-lhe dizendo: Sê paciente comigo e pagar-te-ei tudo.
Lançar-se aos pés significa experimentar uma verdadeira contrição. Que aquele que desejar implorar o perdão se lance aos pés de Jesus, como o servidor.
Suplicar é pedir humilde e devotamente. A confissão deve ser humilde, isto é inclinada para a terra; e devota, disposta à reparação. Enfim, aquele que expia totalmente paga tudo, a fim de que a pena seja à medida da falta. Uma medida define-se em peso, em capacidade, em comprimento e no coração. A verdadeira satisfação deve possuir, o peso do arrependimento, a capacidade do amor, o comprimento da perseverança final, a humildade de coração. Quando estas quatro dimensões se juntam, a misericórdia está presente. A misericórdia, com efeito, purifica a alma dos vícios, enriquece-a com a riqueza das graças e cumula-a com os prazeres das alegrias celestes, porque, como a própria palavra diz, ser misericordioso significa dar ao coração miserável, abandonar a dureza do coração e regar o coração com doçura. Sejamos pois misericordiosos também nós, como o rei que perdoou a dívida ao seu servidor.
Aprofundemos
O coração de Deus está próximo da miséria do pecador.
O Papa Francisco proclamou recentemente que tinha chegado o tempo da misericórdia para nos trazer a cura da miséria devida ao nosso pecado. Toda a Igreja celebrou o Ano santo da Misericórdia. Santo António ajuda-nos a completar esta reflexão.
Jesus mostra que o perdão não se mede com um algarismo, quer seja 7 ou mais! Não calcula quando emprega a palavra “misericórdia”. Santo António pormenoriza a grandeza e a beleza da misericórdia. Para ele, a sua riqueza são três realidades: “Purifica a alma dos vícios, enriquece-a com as riquezas dos carismas, e cumula-a com os prazeres das alegrias celestes”. Com efeito, para António, a ação divina começa por uma ação moral; o pecador deve antes de tudo modificar a sua vida e torná-la melhor; pede a Deus que tenha paciência com ele e isso não se pode realizar sem a graça divina. Acentua também que a própria palavra “misericórdia” significa primeiro que o coração de Deus está próximo da miséria do pecador; aproximando-se dele, Deus purifica-o de todos os seus vícios. A misericórdia de Deus é tão rica em amor que a alma do pecador se transforma, logo que Deus se aproxima dele. Mas não é tudo.
Que nos resta desejar quando o amor de Deus já nos encheu? Santo António sublinha com justeza que o amor de Deus não sendo uma grandeza mensurável, não se esgota na conversão do pecador e na graça do amor. Há uma imensa e misteriosa beleza na misericórdia: como diz António, “ela é uma doçura maravilhosa que rega o coração”. E esta doce misericórdia é sempre para desejar, porque nunca deixa de nos causar sede.