Taís de Alexandria terá sido uma bela cortesã do séc. IV que se tornou penitente. Ganhou brilho de estrela nos finais do século XIX pela mão de Jules Massenet. O compositor, baseando-se na novela Thaïs, de Anatole France, escreveu a ópera com o mesmo nome, em 1894. A Meditação tornou-se numa das mais conhecidas peças para violino. Nela, ouvimos a melancolia da alma que mergulha abaixo da superficialidade e enfrenta a ausência de sentido da vida que a arrasta.
As palavras do eremita austero que viajara para Alexandria, decidido a resgatar a alma da pecadora, provocam um autoexame e uma convulsão tais que resultam no perfeito arrependimento da bela e rica cortesã. Esta inflete a sua vida e segue o cenobita para o deserto, morrendo depois, esgotada por duras penitências, mas vendo o céu abrir-se para a receber – e sem ouvir o eremita, que, tendo sobrevalorizado as suas próprias forças, confessa, vencido, o seu amor por ela. Na viragem do milénio, a soprano norte-americana Reneé Fleming presenteou a humanidade com uma interpretação soberba do itinerário espiritual da personagem; vale a pena escutá-la.
A vida de Santa Taís está contada nas Vitae Patrum (Vidas dos Pais), obra que conta as biografias dos Pais e das Mães do Deserto, e na Vita Thaisis (Vida de Taís). Assim, embora sem culto litúrgico, a lendária cortesã de Alexandria tornou-se conhecida e apreciada durante a Idade Média. Teria levado à ruína vários homens, encantando-os e exigindo quantias elevadas e bens em troca dos seus serviços.
Conta-se que Pafúncio a converteu através de um ardil – pagando-lhe muito, conseguiu adentrar-se de aposento em aposento e, enfim, falar-lhe a sós. Ela converteu-se. Após três anos de penitência na sua cela de eremita, Pafúncio terá compreendido que Taís já expiara os pecados. Esta, ao que parece, viria a morrer quinze dias depois.
Não sabemos em que elementos biográficos se funda a história de Taís. A cortesã existiu, na realidade? Ou será a história da sua vida apenas uma lenda moralizadora? Não o podemos saber. Contudo, a sua permanência na cultura ocidental atesta algo: ainda que a história possa ser ficcionada, não é ficção. Não o era antes de Cristo, não o era no século IV ou na Idade Média, não o é hoje.
Taís encarna um drama de sempre – é isso o que explica a permanência da história.
Mais do que um modelo de penitência, é um conto sobre a misericórdia divina. Taís levou uma vida superficial, manipulou e arruinou deliberadamente vários homens. Deus, contudo, não a rejeitou. Na lenda, a filha pródiga pede, com genuíno arrependimento, para entrar em casa e o Pai abre-lhe as portas do céu. Taís foi, assim, tida na Idade Média por santa, ainda que sem altar.
Neste dossier sobre a Mulher e a Santidade, é legítimo deixar um louvor ao trabalho desenvolvido pelas Irmãs Oblatas. A exemplo de Pafúncio, palmilham as ruas das nossas cidades por amor àquelas que precisam da sua ajuda. Sem as porem em celas, alargam-lhes os horizontes e ajudam-nas a mudar de vida, porque em cada prostituta há uma santa a ser despertada. Muito obrigada, queridas Irmãs Oblatas!
Para saber mais: www.oblatas.com.