Das cinzas novas cores

Dizer verão é dizer cores esplêndidas, luz envolvente, encanto da natureza. Passado um ano da tragédia dos fogos no nosso país, toda a sociedade parou para recordar e tirar lições. Entretanto, a natureza não deixou de pincelar com novos rebentos verdes as matas que ainda continuam a mostrar as feridas do fogo. Quase para nos dizer que a vida é mais forte do que a morte e que a esperança é a última coisa a deixar de existir.

Nós, homens e mulheres, temos mais facilidade em montar tribunais, para defender os nossos direitos e interesses, condenando seja quem for, desde que não seja eu. Temos muito mais dificuldade em assumir as culpas uns dos outros, mais dificuldade em aprender e aceitar a lei da natureza, mais dificuldade de tratar como deve ser a “casa comum”.

As peripécias do navio Aquarius, com a sua “carga” de humanidade ferida e rejeitada, são mais uma confirmação desta nossa dificuldade. Talvez seja o caso de pararmos e fazermos um sério exame de consciência e, em conjunto, com paciência e firmeza, darmos passos concretos em direção à justiça e à verdade.

Quando Caim, depois de ter morto o irmão Abel, foi interpelado por Deus: “Onde está o teu irmão?”, ele respondeu: “Não sei dele. Sou, porventura, guarda do meu irmão?”. Ao que Deus replicou dizendo que “o sangue do irmão clama da terra até Ele” e a própria terra se revoltará contra os que derramarem sangue humano.

Na última visita que o Papa Francisco fez ao Conselho Ecuménico das Igrejas (WCC) em Genebra, ele afirmou com força:

Caminhar segundo o Espírito é rejeitar a mundanidade. É escolher a lógica do serviço e progredir no perdão. É mergulhar na história com o passo de Deus: não com o passo estrondoso da prevaricação, mas com o passo cadenciado de um só preceito: ‘Amarás o próximo como a ti mesmo’.

Eis o segredo para que a vida possa renascer e a luz da esperança possa brilhar no horizonte: nunca se cansar de acolher, servir, perdoar, amar. Se estes verbos não entrarem na linguagem de cada um de nós, e da política, a nossa terra continuará a espalhar sangue e cinzas.

Mas, viremo-nos para as cores do verão, para os muitos sinais de diálogo, de paz, de perdão que, neste último período, marcaram a nossa vida e a própria cena internacional. Deixemo-nos maravilhar por estas cores. Rejubilemos e deixemo-nos conduzir pelo Espírito!

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