O sofrimento transfigurado em sorriso
Vou mirando uma foto que transmite algo de paradoxal: um sorriso que vence a dor no rosto de uma mulher. Trata-se de Chiara Corbella, com um carcinoma na língua, dois meses antes da sua morte que ocorreu a 13 de Junho de 2012.
Em dia de Santo António, a 10 anos da sua morte, escrevo sobre Chiara, ciente que não é fácil apresentar o seu extraordinário percurso e testemunho de vida, como profecia que brota de uma vida marcada, ao mesmo tempo, pelo sofrimento e pela alegria.

Chiara Corbella Petrillo, com apenas 28 anos, sabia que “o mais importante na vida não é fazer coisas, mas nascer e deixar-se amar”, como se lê no epitáfio da sepultura onde se encontram ela e os seus dois primeiros filhos. A sua popularidade continua a crescer como cresceu na sua história a coerência com o Evangelho, a sua paixão pela vida e por Deus.
Chiara Corbello nasce em Roma a 9 de Janeiro de 1984. Cresce juntamente com Elisa, a irmã dois anos mais velha, numa família que lhe transmite a fé, graças sobretudo à participação nos encontros de oração e convívio do movimento carismático presente na sua cidade.
No verão de 2002, Chiara encontra-se de férias na Croácia com algumas colegas do liceu. Aproveita a viagem de laser para visitar a sua irmã que se encontrava em Medjugorie, onde conhece Enrico Petrillo, um jovem romano de 23 anos que participava numa peregrinação mariana. Chiara, com apenas 18 anos, apaixona-se por ele e tem a sensação de estar diante de quem será o seu marido.
Os dois regressam a Roma e iniciam um tempo de namoro. Mas a relação conhece momentos muito difíceis. Chiara escreve no seu diário pessoal:
Depois de 4 anos o nosso namoro começou a vacilar até que nos separamos. Naqueles momentos de sofrimento e de rebelião contra o Senhor, porque achava que Ele não escutava as minhas orações, participei num Campo Vocacional em Assis, onde encontrei a força para acreditar n’Ele, voltei a encontrar Enrico e começamos a deixar-nos acompanhar por um guia espiritual…
Ultrapassados os medos, Chiara e Enrico casaram, em Assis, a 21 de Setembro de 2008, construindo a sua fidelidade matrimonial à sombra da fidelidade de Deus. De regresso da lua de mel, começaram outros grandes desafios ao longo dos quatro anos de matrimónio. Os dois primeiros filhos, Maria e David, traziam graves problemas físicos que determinariam a sua morte pouco depois do parto. À Maria é-lhe diagnosticada uma anencefalia, ao David uma malformação visceral da bacia com ausência dos membros inferiores. Porém, Chiara e Enrico não renunciaram a recebê-los como dom de Deus.

Escreve Chiara no seu caderno:
No casamento o Senhor quis dar-nos filhos especiais: Maria Grazia Letizia e Davide Giovanni, mas pediu-nos que os acompanhássemos apenas até ao nascimento, permitiu-nos abraçá-los, batizá-los e entregá-los nas mãos do Pai numa serenidade e numa alegria arrebatadoras.
Embora não houvesse conexão entre as patologias das duas crianças, Chiara e Enrico, sob a pressão de amigos e familiares, fizeram testes genéticos. Chiara engravidou novamente e viriam a ter um menino saudável a que chamaram Francisco. Mas, no decorrer da gravidez, Chiara descobre um carcinoma na língua. Depois de uma primeira intervenção para retirar a massa tumoral, decide adiar outros tratamentos a que se deveria submeter para não prejudicar o desenvolvimento da criança.
Escreve Chiara:
Para a maioria dos médicos, Francisco era apenas um feto de sete meses. Era a mim que era preciso. Mas eu não tinha intenção de colocar a vida de Francisco em risco, por algumas estatísticas que não estavam certas e que queriam convencer-me que era necessário forçar o nascimento prematuro do meu filho para eu ser operada.
Francisco Petrillo nasceu a 30 de Maio de 2011. Chiara, ainda na maternidade, iniciou logo a segunda fase dos tratamentos. Infelizmente o tumor continuava a estender-se, chegando aos gânglios linfáticos, aos pulmões e ao fígado e, por fim, ao olho direito, que Chiara resolveu vedar para limitar os problemas da visão.
Um ano depois do nascimento de Francisco, Chiara morrerá de cancro, ao meio dia, de 13 de Junho de 2012, depois de se ter despedido de todos, familiares e amigos, repetindo a cada um: “Quero-te bem!”. Na manhã daquele mesmo dia, o marido Enrico tinha-lhe perguntado: “Meu amor, mas o jugo do Senhor é realmente suave?”. E ela que já respirava e falava com muita dificuldade, responde sorrindo: “Sim, Enrico, é muito suave”.
A vida de Chiara Corbella foi pautada pela alegria e pela serenidade. A doença, o choque e a perda dos filhos não conseguiram afugentar a felicidade do casal, que sempre se alicerçou na relação com Deus através da oração.
Chiara deixou ao filho, Francisco, uma carta testamento por ocasião do seu primeiro aniversário, com estas palavras:
A razão da nossa vida é amar e estar sempre prontos para aprender a amar os outros como só Deus nos pode ensinar. Tudo o que fizeres só terá sentido se o fizeres em função da vida eterna. Se amares a sério, verás que nada te pertence, porque tudo é graça. Tu és único e tens uma grande missão. O Senhor desde sempre te quis e te mostrará o caminho a seguir se lhe abrires o coração. Confia nele, vale a pena!
A alegria que marcou a vida de Chiara continua a contagiar, pois a vida vence a morte, como ela dizia: “Nascemos e não morremos”. O facto de se saber amada e de viver a partir desta verdade, suscitava nela o sorriso mais autêntico, um sorriso que transfigurava a dor.
Em dia de Santo António (casamenteiro) apraz-me apresentar a história de Enrico e Chiara, uma história devastadora do ponto de vista humano, mas de uma beleza única se a olharmos com os olhos do Amor que tudo transforma em graça.
O contrário do amor, possuir;
O contrário do medo, a fé;
O contrário da morte, a alegria!
Chiara
You must be logged in to post a comment.