Breviário do Silêncio

Será um passo paradoxal falar do silêncio: afinal, ele será rompido para que dele se fale. Mas sabemos, na nossa experiência quotidiana, como a ausência de reflexão pode ser sinónimo, não de silêncio, mas de um adormecimento nos ruídos, distrações e imagens que constantemente nos interpelam.

O caminho aqui desenvolvido com coragem por João Barrento – com um percurso invejável na área da tradução, da crítica literária e do ensino, dedicados de modo particular à poesia e à literatura alemãs – transporta o leitor, num registo de prosa muito próximo de uma poética da linguagem, para as diversas facetas com que o silêncio regista o humano. As imagens que acompanham o corpo do texto contêm um valor simbólico denso, ajudando a criar pausas na leitura. Da poesia de Echevarría à escrita de Llansol – de cuja obra o autor é um dos principais curadores –, da arte de Rui Chafes ao património literário de Paul Celan, de Holderlin e da poesia clássica chinesa – Barrento conduz-nos por um saborear este bem tão raro e tão gratuito como é o silêncio. Mas também o silêncio da natureza, da leitura ou da tradição monástica são aqui convocados para um exercício de atenção e de escuta. Há leituras que se fazem devagar, que despertam a atenção, que deixam um travo de sabedoria que devolve à vida a sua beleza.

O silêncio não é explicável. Não só porque se furta aos princípios de articulação da linguagem, mas também porque ele é, em si e quando irrompe e se demarca do som, uma realidade e uma experiência auto-suficiente e autónoma. Qualquer tentativa de explicação da experiência (não do fenómeno!) do silêncio seria uma contradição. O silêncio propicia, em última análise, o acesso a uma “fala” do mundo e das coisas na sua radicalidade ontológica, sem explicações. É a pura presença.

Breviário do Silêncio
Autor: João Barrento
Edição: Alambique
Páginas: 160

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