O erro poderia ter-se tornado numa oportunidade de ouro para aprendermos a abordar o tema com as crianças, mostrando as diferenças entre o amor partilhado por companheiros do mesmo sexo e o amor conjugal.
A bibliotecária Ellie Newell costuma ler histórias a grupos de crianças nas bibliotecas públicas americanas. Na sua mesa, os livros infantis para ler em voz alta contêm histórias de diversos tipos. Umas são sobre animais, outras são mais clássicas e existem ainda alguns novos lançamentos. Naquele dia, o livro de cima intitulava-se O Príncipe e o Cavaleiro.

Neste livro existe o habitual dragão, mas não há princesa no cimo da torre. A história de amor acontece entre um príncipe e o cavaleiro e termina em casamento. O tema da homossexualidade parecia-lhe razoavelmente abordado e optou por aquela história. As crianças daquele grupo acolheram todas as nuances com o entusiasmo habitual. Era uma turma de uma escola católica e a cara da professora espelhava o seu claro incómodo com a história.
A professora trouxe a público esta situação. Vários cidadãos ficaram indignados e a polémica instalou-se com posições extremas a manifestarem-se em torno do tópico controverso da homossexualidade e da sua abordagem junto de crianças que pensam em tudo menos nisso.
Uma vez mais, no artigo de opinião escrito para o The New Yorker, a professora católica é a má da fita e a bibliotecária a heroína dos direitos a introduzir a homossexualidade como parte da educação das crianças.
Ao ler este artigo não pude deixar de pensar terem-se cometido inúmeros erros de discernimento que fazem desta qualidade humana uma das mais importantes a desenvolver desde crianças, se quisermos evitar os erros dos adultos.
O n. 3 do Art. 26º da Carta dos Direitos Humanos diz que — “Aos pais pertence a prioridade do direito de escolher o género de educação a dar aos filhos”. Em que o “género” não inclui matérias como as ciências humanas e naturais, mas as abordagens que dizem respeito ao desenvolvimento integral dos jovens, como seria o caso da educação sexual ligada ao tema mais alargado do amor humano. Este acontecimento nos Estados Unidos onde os jovens, a Igreja e a sociedade se entrelaçam poderia ter sido uma oportunidade de amadurecimento no respeito por este Direito Humano associado aos pais, mas não foi esse o caso. Gostaria de destacar dois erros de discernimento.
O primeiro erro foi da bibliotecária. Contar uma história a uma criança é um momento fundamental no desenvolvimento da sua imaginação, mas sobretudo dos ideais e valores que estão por detrás da moral da história. Se tivesse à sua frente um grupo de crianças muçulmanas, seguramente que não escolheria uma história que ridicularizasse a sua religião. Por isso, o erro da bibliotecária foi o descuido em conhecer a origem do grupo a quem iria ler a história. Se o tivesse feito, poderia ter confrontado o conteúdo com a professora e se essa não achasse adequado, mudaria de história e não haveria qualquer colisão no processo educativo.
Argumentar que todas as crianças devem conhecer histórias de amor de acordo com a diversidade de relacionamentos possíveis na sociedade é uma imposição ideológica. Deixa de o ser quando se torna uma proposta, sobretudo por ser numa biblioteca pública.
O segundo erro foi da professora. Em vez de ter aproveitado o primeiro erro para enfrentar, criativamente, esse tema com o qual, mais cedo ou mais tarde (e cada vez mais cedo), as crianças se confrontam, opta pelo tabu e inicia uma onda de indignação. Mesmo discordando da opção da bibliotecária, para aquelas crianças, o assunto não passava de uma história e, tocando num tema delicado, o erro poderia ter-se tornado numa oportunidade de ouro para aprendermos a abordar o tema com as crianças, mostrando as diferenças entre o amor partilhado por companheiros do mesmo sexo e o amor conjugal.
No primeiro, as crianças teriam aprendido o respeito pelas pessoas e suas escolhas e no segundo teriam aprendido sobre a beleza do amor na máxima diferença que o relacionamento dos sexos oferece, biologicamente, entre um homem e uma mulher.
O laicismo presente na bibliotecária e o catolicismo presente na professora mostram como a mente respeitadora que o psicólogo Howard Gardner considerava como uma das mentes do futuro, ainda está por desenvolver.
O pensamento católico precisa de desenvolver mais o interesse, entusiasmo e beleza pelo sentido moral das coisas, em vez da reação indignada moralista que pode deitar tudo a perder.
As histórias são fundamentais para que as crianças e jovens possam desenvolver a sua imaginação em torno dos valores que nos humanizam. Todos cometemos erros, mas se encarássemos mais os erros dos outros como oportunidades de aprofundar o nosso modo de ver as realidades, os obstáculos tornar-se-iam trampolins.
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