Deram-me o prazo para escrever o meu post mensal, para o dia 14 de Fevereiro. E logo surgiu-me a palavra apaixonado.
Era o dia de São Valentim e na paróquia ferviam os preparativos para o Jantar do Amor organizado pela Pastoral Familiar e amigos. Mas eu que não tinha parceira para puder participar ao divinal banquete – por causa do bendito celibato tão falado a torto e a direito, nestas épocas − não descurei de um sentimento e de uma experiência que nos acomuna indistintamente: o amor apaixonado.
Provocado pelas circunstâncias destes dias, senti a necessidade de conjugar o tema do amor com o da eutanásia. Há quem invoque a permissão da eutanásia, achando-a um ato de amor, ou pelo menos de humanização do irremediável destino de morte de cada ser humano.
Será que é por amor, que invocamos do Estado uma despenalização da eutanásia e do suicídio assistido? Não vou buscar o que acontece, já, nos países ocidentais que nos servem de modelo para sermos também em Portugal um país moderno. Basta, apenas, saber que a Holanda, agora, está a debater a distribuição gratuita e sem prescrição médica de um comprimido letal a pessoas com idade superior a 70 anos que estejam cansadas de viver.
Tudo aquilo que hoje é sinal de fragilidade, de não-produtivo, de peso económico, passa a ser algo que pertence ao âmbito do descarte, uma presença a mais. Um idoso deve ser ativo, assim pelo menos anda na zumba, na piscina, na palestra e em outras atividades rentáveis. Mas um idoso ou um doente, parado, com uma doença degenerativa, torna-se terra de ninguém, uma situação de vida que não produz vida, portanto um ser invisível, condenado a morrer atrás de uma cortina do hospital, higienicamente separados de nós, os vivos!
O desafio do humanismo (para não falar só do cristianismo de maneira confessional) está na certeza que também a fragilidade, o momento terminal da vida (longo ou curto que seja), contém vida, contém uma sabedoria que é preciso contemplar, acolher, tocar, permanecendo em silêncio ao lado de quem está a viver a parábola final da sua vida, no despojamento de tudo.
Mais uma vez, um tema tão fraturante, nos obriga a repensar o âmago da nossa fé cristã: apaixonados por quem e por quê? Urge formar cada geração a um encontro com as realidades mais descuidadas da sociedade moderna. Uma destas é a invisibilidade do sofrimento e da morte, para viver com paixão o dom da vida em todas as suas fases.
Foto da capa: Um casal trocando um beijo junto à Fonte de Trevi no Dia dos Namorados, em Roma, Itália, 14 de fevereiro de 2020. EPA / LUCIANO DEL CASTILLO