No princípio era o movimento
Lumière, Thierry Frémaux, Instituto Lumière de Lyon
2016 – França
Lumière não é um filme. São cento e oito brevíssimos filmes de cinquenta e cinco segundos cada um, mais um epílogo, uma verdadeira delícia para quem gosta de cinema e, se calhar, não tanto de filmes. Só mesmo para amantes do cinema, tout court!
Lumière é um ‘projeto didático e produzido à la maison pelo Institut Lumière, organismo público sediado em Lyon, um documentário importante que emociona sob vários aspectos… O espectador deixa a sala com a ideia de que os Lumière (sobretudo Louis, o irmão que filmava) não só inventaram o cinematógrafo como quase tudo o que o constitui, clarificando alguns enganos do senso comum.
Francisco Ferreira, Expresso, de 14 de outubro de 2017
Está tudo ali, de facto: o documentário, a encenação, o enquadramento, a luz, os grandes planos, a multidão, o choro e o riso, o suspense e a comédia, a invenção da remake, as linhas diagonais, as cidades e os países, o trabalho e a diversão…
“A primeira personagem é a multidão, o povo. O primeiro cinema disse logo que o cinema era para dizer quem somos… Devo contar uma história com uma câmara, como e qual a posição dela? Essa é a questão de sempre, é a questão dos cineastas de hoje” diz Thierry Frémaux, o narrador, que nos ajuda a reparar nos pequenos pormenores de cada um dos filmes, que nos faz ver o cinema já presente naquelas imagens e que encontra, já ali, Spielberg, Ford, Raoul Wash, Eisenstein, Ozu, Truffaut, Hitchcock, Richard Fleischer ou James Cameron… É como se essas maneiras de filmar anunciassem já todo o cinema que viria a ser feito e está a ser feito.
O mesmo Thierry Frémaux diz ainda, a propósito desta aventura de ir aos primórdios e contar a história dos irmãos Lumière:
Não há muitos documentos, mas há algumas cartas, há recordações de operadores, há o diário de Gabriel Veyre, que foi ao México, ao Vietname, ao Japão. Pode fazer-se a história Lumière como uma história de hipóteses, de ideias, que nos obriga a refletir. Da mesma maneira que ver os filmes Lumière nos lava os olhos, nos limpa o cérebro, nos obriga a compreender o que é um plano, o que é o tempo. Refletir.
Citação do suplemento ípsilon, do Público, de 13 de outubro de 2017
Que dizer mais de um ‘filme’ tão autêntico e encantatório como este, só para amantes de cinema, como disse?
Que é um filme de perguntas, que é como abrir um baú que, inesperadamente, mas, felizmente para nós, está cheio com um tesouro inesgotável que sempre esteve ali, à nossa espera, para nos podermos deliciar e sonhar. Muito obrigado, Instituto Lumière de Lyon, por esta preciosidade tão antiga e tão nova.
Falta só uma palavra para a magnífica banda sonora escolhida para acompanhar todas aquelas imagens em movimento: é do compositor Camille Saint-Saëns, contemporâneo de Auguste e Louis, os irmãos Lumière.